27 de setembro de 2010

Papagaios Candangos (Era para ser: Amorfismo Lingüístico)

Viajar pelo Brasil afora tem conseqüências no mínimo engraçadas. Geralmente é possível ver como identidades culturais regionais, especialmente as lingüísticas, podem ser curiosas. Neste caso específico foi o sotaque. E muito embora seja fácil achar engraçado a cultura de fora, quanto mais saio de casa, mais vejo que os engraçados de verdade somos nós, brasilienses.

Ponto de convergência nacional e de multirregionalidade que é a Capital, confere ela aos seus locais uma condição muito estranha que vou chamar de amorfismo lingüístico, por falta (leia-se preguiça) de ter achado um termo melhor.

Amorfismo eu digo no sentido não apenas de uma mera falta de forma, mas sim de um condição tão incipiente que se assemelharia a uma massinha de modelar. Qualquer coisa que a toque, ou que a manipule por pouco segundos é capaz de lhe conferir uma forma mais bem definida.

Digo isso porque é possível notar o quão comum para os brasilienses – guilty as charged here – reproduzirem (para não usar o termo “imitar”) a cadência lingüística e vocabular do lugar onde estão. Antes eu pensava que eu era o único mané que fazia isso, mas depois de um pouquinho de tempo fora do Planalto Central e muita troca de idéias com iguais egressos, tive (e confesso; para o meu alívio) a confirmação que não.

Pus-me então a pensar sobre as razões para isso. Uns podem tentar justificar como ausência de identidade/vínculo regional pela grande miscelânea de povos no Brasil que compõem a região; como fruto da imparcialidade dos meios de comunicação importada (em parte) do meio político e do servidorismo público; tentativa de inclusão no outro meio pelo artifício de aproximação da fala...

Eu já penso diferente: somos, nós brasilienses, verdadeiros papagaios ambulantes.


Currupaco!

24 de setembro de 2010

A Paixão Cega

As pessoas costumam dizer que a paixão cega.Exclui-se o lado racional da cognição e remete-se ao passional, de forma que as decisões acabam não sendo das melhores. Até pouco tempo eu não acreditava muito nisso.

Começou quando, brincado na chuva, entramos numa poça d’água mais profunda. O baque foi forte. Forte a ponto de rachar o centro vital da relação. Muito se viu, sem, necessariamente, precisar se ver. A necessidade de cuidado foi imediata e, com isso, lá se foram boas doses Reais (se é que me entende) de unidades de milhar.

Depois foram os buracos da vida que vieram a causar mazela. O pé básico se deslocou e o caminhar à frente deixou de ser viável. Perguntei-me por que optara (ou o que fazia) navegando por um caminho tão esburacado e o que tinha me levado a ele. Mas o sentimento falou mais alto e, mais uma vez, remetemos aos cuidados para reparar o que havia se estragado. Mas confesso que esta foi a primeira vez que fiquei realmente reticente.

Tempos depois, num passeio despretensioso, decidiu parar abruptamente. Depois veio justificar que não havia se recuperado por completo da lesão passada, que impedira de seguir adiante, na ocasião. Eu bem que desconfiei que os passos já não eram mais tão seguros. Mas cuidei. Cuidei por zelo e de coração, mais uma vez tratando da razão do destrato, que já apontava que mais seria levado adiante.

Eis que por um bom tempo as coisas funcionaram de forma alinhada, sem desvios, vibrações, ou qualquer outra desestabilidade. A tranqüilidade era absoluta. Contudo, o perfeito só se mantém até quando o tempo lhe permite. Por fim, solavancos começaram a aparecer.

Sem razões inteligíveis aparentes, o que ora deslizava, agora muitas vezes se continha em trancos inexplicáveis. Conversei com muitas pessoas, mas nenhuma soube explicar o que acontecia. Optei por ignorar e deixar como estava.

Até que algo levou ao desalinho. Para que direção? Não importa. O fato era que não estava mais direito. Finalmente dei-me conta do óbvio. Não tinha mais como manter. Se tornara insustentável.

Foi quando anunciei o carro. E felizmente vendeu rápido. Moral da história: não se apaixone por automóveis. O quê? Pensou que estivesse me referindo a outra coisa?